Uma carta sobre o conceito de férias em Teatro
Das primeiras coisas que ouvi uma professora dizer quando entrei para a escola de teatro é que «férias para um actor significa desemprego».
Durante muito tempo, esta frase ecoou na minha mente sem ter grande contraditório. De facto, grande parte dos actores, quando estão de férias, não têm subsídio ou 13º mês. Faz-se férias porque, em Agosto, grande parte dos teatros fecham para dar descanso aos trabalhadores que, esses sim, recebem (ou deveriam receber) 13º e 14º mês.
Acho que, talvez por isso, nunca soube muito bem parar. Assim, Agosto para mim sempre foi um mês de muita escrita, de preparação do que aí vinha, de tentar começar um ou outro projectos destinados a não ter qualquer tipo de continuidade. Agosto é, verdadeiramente, o mês do texto na gaveta.
É um conceito algo estranho para mim, então, que este ano tenha tentado, activamente, parar. Parece paradoxal, estar activamente parado, mas é aquilo a que anos e anos de não-conseguir-estar-quieto-se-não-explodo fazem a uma pessoa. É preciso, assim, procurar estar activamente parado.
Não é que não tivesse nada para fazer. Há constantemente coisas a preparar: candidaturas, textos, fechar elencos, orçamentar isto e aquilo e o preço da gasolina e se não sei quem pode emprestar carro ou se é preciso alugar ou se o hotel faz um preço especial por serem 10 em digressão ou então vai tudo para um hostel com camarata mista. Enfim, trabalhar para poder trabalhar.
Como é natural, não consegui ficar quieto. Mas tentei de forma activa e consciente desligar do telemóvel, não ir ao email, ler aquele livro que estava para ler há não sei quantos anos para depois desistir e ir ver desenhos animados. Até à praia fui, fenómeno social que não serve para mim, que tenho a composição dérmica de um boneco de neve.
A minha reflexão surge, então, de ser necessário parar para absorver aquilo que há de mundo fora das engrenagens de uma máquina que há muito não ficava quieta. E de ter encontrado inspiração com potencial cénico em coisas que já não me lembrava que de lá poderia brotar.
Da fatia de cheesecake que era absolutamente medíocre até chegar à melhor bolacha que poderia ter imaginado, a ter passado três horas de um jantar em casa de amigos a ignorá-los para brincar com um gato bebé que me destruiu as pernas, penso que seja deste tipo de fenómenos que se contrói um imaginário, e que mais vida implica, necessariamente, inspirações mais diversas.
De qualquer forma, nada disto é assim tão sério.